Fracasso

Ajustou bem o nó para que não se soltasse, subiu na cadeira com todo o peso do mundo,  pela memória desfilavam recordações de uma vida efêmera e vazia,  possuía uma esposa que nunca amou, filhos bastardos que mal conheceu, dois meios-irmãos com quem nunca se entendeu, um pai que não constava na sua certidão de nascimento e uma mãe que jamais se lembrou da data do seu aniversário. Tinha um emprego enfadonho e mal remunerado em que nunca recebeu qualquer reconhecimento pelo seu empenho. Uma vez por mês frequentava um prostíbulo na periferia da cidade onde deixava parte do ordenado em troca de uísque paraguaio e de prostitutas tão roliças como uma escultura de Botero. Atribuía ao álcool a enxaqueca do dia seguinte. Certa vez, leu num livro de poesia que o homem é do tamanho do seu sonho, sonhava ser tanta coisa que acabou sendo coisa nenhuma. Não havia nascido para a glória, dava-se melhor com o fracasso, sentia-se parte de uma multidão de condenados que vagam a esmo, esperando pelo fim, com a diferença de que ele tinha plena consciência da sua mediocridade. Estava às vésperas de seu aniversário, completaria mais uma década de uma existência quase nula e fugaz, perdeu o gosto pela vida, se é que alguma vez o teve, talvez na infância, mas já fazia tanto tempo que nem lembrava mais, melhor era esquecer-se de tudo, sairia da vida como quem sai batendo a porta. Num movimento brusco, empurrou a cadeira que o sustentava, seu corpo balançou no ar contorcendo-se todo na sensação de uma última agonia. Até que o galho que o aguentava também não o suportou. Frustração. Havia fracassado na vida. Não era de se esperar melhor sorte agora.

 

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